Uma conta bancária na Suíça, conhecida 
como "Marília", teria sido usada para movimentar as supostas propinas 
que azeitaram os negócios da Siemens e da Alstom com governos do PSDB, 
em São Paulo. Por ela, transitaram cerca de R$ 64 milhões em propinas e 
os recursos foram gerenciados por homens da cozinha dos governos de 
Mario Covas, em São Paulo, e até do ex-presidente Fernando Henrique 
Cardoso. Este é o tema de uma reportagem bombástica da revista Istoé, 
que acaba de chegar às bancas. Até agora, o procurador Rodrigo de 
Grandis reluta em denunciar tucanos indiciados pela Polícia Federal 
(leia aqui). Será que vai manter a conduta?
Leia abaixo a reportagem de Istoé:
A conta secreta do propinoduto
Documentos vindos da Suíça revelam que 
conta conhecida como "Marília", aberta no Multi Commercial Bank, em 
Genebra, movimentou somas milionárias para subornar homens públicos e 
conseguir vantagens para as empresas Siemens e Alstom nos governos do 
PSDB paulista
Claudio Dantas Sequeira e Pedro Marcondes de Moura
Na edição da semana passada, ISTOÉ revelou
 quem eram as autoridades e os servidores públicos que participaram do 
esquema de cartel do Metrô em São Paulo, distribuíram a propina e 
desviaram recursos para campanhas tucanas, como operavam e quais eram 
suas relações com os políticos do PSDB paulista.
Agora, com base numa pilha de documentos 
que o Ministério da Justiça recebeu das autoridades suíças com 
informações financeiras e quebras de sigilo bancário, já é possível 
saber detalhes do que os investigadores avaliam ser uma das principais 
contas usadas para abastecer o propinoduto tucano. De acordo com a 
documentação obtida com exclusividade por ISTOÉ, a até agora 
desconhecida “conta Marília”, aberta no Multi Commercial Bank, hoje 
Leumi Private Bank AG, sob o número 18.626, movimentou apenas entre 1998
 e 2002 mais de 20 milhões de euros, o equivalente a R$ 64 milhões. O 
dinheiro é originário de um complexo circuito financeiro que envolve 
offshores, gestores de investimento e lobistas.
Uma análise preliminar da movimentação da 
“conta Marília” indica que Alstom e Siemens partilharam do mesmo esquema
 de suborno para conseguir contratos bilionários com sucessivos governos
 tucanos em São Paulo. Segundo fontes do Ministério Público, entre os 
beneficiários do dinheiro da conta secreta está Robson Marinho, o 
conselheiro do Tribunal de Contas que foi homem da estrita confiança e 
coordenador de campanha do ex-governador tucano Mário Covas. Da 
“Marília” também saíram recursos para contas das empresas de Arthur 
Teixeira e José Geraldo Villas Boas, lobistas que serviam de 
intermediários para a propina paga aos tucanos pelas multinacionais 
francesa e alemã.
O lobista Arthur Teixeira personifica o 
elo entre os esquemas Alstom e Siemens. Como ISTOÉ já revelou numa série
 de reportagens recentes, com base nas investigações em curso, Teixeira e
 seu irmão Sérgio (já falecido) foram responsáveis por abrir as empresas
 Procint e Constech, além das offshores Leraway Consulting e Gantown 
Consulting, no Uruguai, com o único objetivo de servir de ponte ao 
pagamento de comissões a servidores públicos e a políticos do PSDB. 
Teixeira tinha acesso privilegiado ao secretário de Transportes 
Metropolitanos, Jurandir Fernandes, e ao diretor de Operação e 
Manutenção da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), José 
Luiz Lavorente, o encarregado da distribuição em mãos da propina.
Até 2003 conhecido como Multi Commercial 
Bank, depois Safdié e, a partir de 2012, Leumi Private Bank AG, a 
instituição bancária tem um histórico de parcerias com governos tucanos.
 Em investigações anteriores, o MP já havia descoberto uma outra conta 
bancária nesse banco em nome de Villas Boas e de Jorge Fagali Neto, 
ex-secretário de Transportes Metropolitanos de SP (1994, gestão de Luiz 
Antônio Fleury Filho) e ex-diretor dos Correios (1997) e de projetos de 
ensino superior do Ministério da Educação (2000 a 2003) na gestão 
Fernando Henrique Cardoso. Apesar de estar fora da administração 
paulista numa das épocas do pagamento de propina, Fagali manteria, 
segundo a Polícia Federal, ascendência e contatos no governo paulista. 
Por isso, foi indiciado pela PF sob acusação de formação de quadrilha, 
lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Fagali Neto também é irmão de 
José Jorge Fagali, que presidiu o Metrô na gestão de José Serra. José 
Jorge é acusado pelo MP e pelo Tribunal de Contas Estadual de fraudar 
licitações e assinar contratos superfaturados à frente do Metrô.
Para os investigadores, a “conta Marília” era usada para gerenciar recursos
de outras contas destinadas a abastecer empresas e fundações de fachada
Para os investigadores, a “conta Marília” 
funcionaria como uma espécie de “conta master”, usada para gerenciar 
recursos de outras que, por sua vez, abasteceram empresas e fundações de
 fachada, como Hexagon Technical Company, Woler Consultants, Andros 
Management, Janus, Taltos, Splendore Associados, além da já conhecida 
MCA Uruguay e das fundações Lenobrig, Nilton e Andros. O MP chegou a 
pedir, sem sucesso, às autoridades suíças e francesas o arresto de bens e
 o bloqueio das contas das pessoas físicas e jurídicas citadas. Os 
pedidos de bloqueio foram reiterados pelo DRCI, mas não foram atendidos.
 Os investigados recorreram ao STJ para evitar ações similares no 
Brasil.
O MP já havia revelado a existência das 
contas Orange (Laranja) Internacional, operada pelo MTB Bank de Nova 
York, e Kisser (Beijoqueiro) Investment, no banco Audi de Luxemburgo. Ou
 seja, “Marília” é mais um nome próprio no dicionário da corrupção 
tucana. Sabe-se ainda que o cartel operado pelas empresas Siemens e 
Alstom, em companhia de empreiteiras e consultorias, usava e-mails 
cifrados (leia quadro).
RELAÇÃO COM FHC
Um dos beneficiários da propina oriunda da Suíça, Geraldo Villas Boas
mantinha uma conta conjunta com Jorge Fagali Neto, ex-diretor de projetos do
Ministério da Educação (2000 a 2003) na gestão de Fernando Henrique Cardoso
Os novos dados obtidos pelo Departamento 
de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) do Ministério
 da Justiça dão combustível para o aprofundamento das investigações no 
Brasil. Além do processo administrativo aberto pelo Cade sobre denúncia 
de formação de cartel nas licitações de São Paulo e do Distrito Federal,
 outras duas ações sigilosas, uma na 6ª Vara Federal Criminal e outra na
 13ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, apuram crimes contra o 
sistema financeiro, lavagem de dinheiro e improbidade administrativa. 
Além de altos funcionários do Metrô, como os já citados Lavorente e 
Fagali, as investigações apuram a participação do ex-secretário de 
Energia e vereador Andrea Matarazzo, em razão de contratos celebrados 
entre a Companhia de Energia de São Paulo (CESPE) e a Empresa Paulista 
de Transmissão de Energia Elétrica S.A. (EPTE).
Na documentação encaminhada pelo DRCI ao 
MP de São Paulo, a pedido do promotor Silvio Marques, também constam 
novos dados bancários de vários executivos franceses, alemães e 
brasileiros que tiveram algum tipo de participação no esquema de 
propinas. São eles os franceses Michel Louis Mignot, Yves Barbier de La 
Serre, André Raymond Louis Botto, Patrick Ernest Morancy, Jean Pierre 
Antoine Courtadon e Jean Marcel Jackie Lannelongue e os brasileiros José
 Amaro Pinto Ramos, Sabino Indelicato e Luci Lopes Indelicato, além do 
alemão Oskar Holenwger, que operou em toda a América Latina. Na 
Venezuela, Holenwger é citado junto a Mignot, La Serre, Morancy e Botto 
em investigação sobre lavagem de dinheiro, apropriação indébita 
qualificada, falsificação de documentos e suposta corrupção de 
funcionários públicos do setor de energia.
O apoio das autoridades de França e Suíça 
às investigações brasileiras não tem sido tão fácil, e a cooperação é 
mais recente do que se pensava. O Ministério da Justiça chegou a pedir o
 compartilhamento de informações ainda em 2008 – auge da investigação da
 Siemens e da Alstom. Mas não foi atendido. Os franceses lembraram que, 
nos termos do acordo bilateral, a cooperação só pode se desenrolar por 
via judicial. Dessa forma, foi necessário notificar o Ministério Público
 Federal para que oficiasse junto à 6ª Vara Criminal Federal e à 13ª 
Vara da Fazenda Pública. O compartilhamento só foi efetivado em dezembro
 de 2010.
A Suíça, ainda em março de 2010, solicitou
 a cooperação brasileira na apuração das denúncias lá, uma vez que parte
 do dinheiro envolvido nas transações criminosas teria sido depositada 
em bancos suíços. Os primeiros dados, relativos à empresa MCA e ao Banco
 Audi de Luxemburgo, chegaram ao Brasil em julho de 2011. Foram 
solicitadas ainda oitivas com determinadas testemunhas, o que foi 
encaminhado ao MPF em São Paulo e à Procuradoria Geral da República 
(PGR). Paralelamente, a Polícia Federal abriu o inquérito nº 
0006881-06.2010.403.6181, mas só no último dia 25 de julho o procurador 
suíço enviou às autoridades os dados bancários solicitados, por meio de 
uma decisão denominada “conclusive decrees”, proferida em 14 e 24 de 
junho. Foi com base nisso que a Suíça já bloqueou cerca de 7,5 milhões 
de euros que estavam na conta conjunta de Fagali e Villas Boas, no 
Safdié. Tratou-se de uma decisão unilateral suíça e a cifra não é 
oficial – foi fornecida ao Ministério da Justiça por fonte informal. A 
Suíça só permite o uso dos dados enviados em procedimentos criminais.

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